De Isabel Stilwell, em Como Dei Com O Meu Psiquiatra Em Louco :
"Já há muito que Hermenegilda se andava a estranhar. Curiosamente, desde que conhecera Segismundo que até sonhava com polvo assado, pezinhos de coentrada e mesmo com feijoada à transmontana. Chegara a entrar em pânico, soccorrendo-se do psiquiatra que há muito a acompanhava, procurando desesperadamente um diagnóstico para os sintomas nos anais da medicina. No dia em que, incitada por Segismundo, lançou o garfo a uma orelhinha de porco, temperada com alho, decidiu que talvez necessitasse de internamento e tudo isto não passasse de uma tal bulimia de que tinha ouvido falar.
(...)Os amigos estranharam. Escondia deles a sua ida à lota e escapulia-se pela porta dos fundos do talho, para que não a vissem por lá. Mas gostava de exibir a Segismundo os seus progressos: "meu amor", dizia ela embevecida, "queres ver que já distingo um camarão de uma ostra?" Ou, noutra ocasião: "Querido, agora é que nunca mais me esqueço. Costoletas são aqueles bifes com osso, não são?"
Segismundo comovia-se. Hermenegilda ganhava carnes, as bochechas já rosadas, como devem ser as de uma moça com saúde. E decidiu que tinha a obrigação moral de fazer qualquer coisa pelos meninos, tão delgadinhos que metia pena.
(...)E no momento em que, por estranha coincidência, o padrasto lhes disse que a primeira lição seriam panquecas, limitaram-se a encolher os ombros. Hermenegilda até lhes tirou uma polaróide. Ah, como valia a pena seguir os manuais de psicologia. Afinal, não eram muito diferentes dos de cozinha: bastava juntar os ingredientes, tal e qual lá vinha escrito."
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